Boris Kossoy |
Preparara-se para dormir como habitualmente fazia. Todos, com o tempo, criam rituais para o momento de se deitar e com ele não era diferente. Logo após se olhar no espelho e notar suas olheiras, que outrora lhe disseram serem profundas ficou a pensar por alguns minutos ente sua imagem refletida no espelho, se seria cansaço, tempo ou apenas algo genético, de imediato afastou tal pensamento e tentou se fixar no ritual: escovar os dentes e se aprontar para dormir. Ao entrar no quarto, organizou sua cama como de costume, vestiu sua roupa própria para deitar-se e apagou as luzes. Sempre refletia muito no escuro – desde pequeno - habituara há ficar alguns minutos a retroceder no seu dia ou na sua semana, nos dias mais conturbados simplesmente dormia, porém estava disposto a ficar deitado a imaginar o futuro que planejava tão ansiosamente, o que lhe parecia perigoso, pois o destino por vezes é implacável.
Logo sentiu um aperto no peito, tentou afastar a ideia e a imagem que tinha se tornado comum nos últimos dias sendo-lhe insuportável a ideia de se centrar num ser que sumira de sua vida, sem deixar nenhuma explicação plausível. Concordava consigo: algo intenso quando o toca, mesmo que por apenas dois dias o deixava nesse estado de imersão, não sabia bem se era sobre si ou sobre o mundo. Como pudera deixar se envolver a tal ponto? Um bom questionamento sem resposta. Entregara-se de uma maneira tão sem reservas que lhe sobrara apenas a última alternativa – que era repetido diversas vezes – tomar suas pílulas e tentar por fim esquecer. Sabia bem que não esqueceria, mas sentia que ao menos amenizava a dor, essa tão estranha, atípica, o envolvia a noite e não lhe largava, a solidão que estava tão aceita agora estava prestes a lhe mover para a loucura do nada. Quando chegamos perto do nada o mundo fica mais confuso, sem cores, motivação, e o que mais lhe preocupava era toda a falácia que propagava aos seus amigos próximos, se sentia um completo cretino por não seguir seus próprios conselhos dados.
O cheiro que ficara no lençol que os envolveram no último encontro desapareceu, inutilmente pegou e o segurou firme a apertar com suas mãos levando ao seu nariz, a respirar fundo e dando tragadas fortes para tentar encontrar ali algum resquício do cheiro misturado dos dois corpos, lembrava que somente si gozara, quando perguntara entre sussurros e escuridão se o corpo a sua frente queria gozar recebeu como resposta uma negativa. Talvez ali houvesse sentidos que escapavam de sua compreensão, talvez ali residisse o erro fatal do qual não deveria ter cometido. Provável que tenha se adiantado em algo que demandaria calma e paciência, para que acontecesse no momento mútuo de aceitação.
Percebera a tamanha tolice que o levava a pensar em tudo isso. Se ao menos seus pensamentos tivesse o poder de invadir a mente de quem era o causador de toda essa euforia melancólica se sentiria mais satisfeito, pois estariam conectados de alguma forma. Novamente tentou balbuciar algumas palavras, que na verdade para si era uma oração, só não sabia se se referia a algum deus ou ao tempo. Qual será o acordo que vamos chegar desta vez? – perguntara pra si, só conseguia concluir que não se deixaria mais se envolver, não iria se entregar, deixaria apenas a volúpia o inflamar, nada mais do que prazer, assim se sentiria importante, especial na vida de quem o engolisse em noites quentes, preferia o calor pois aumentava o suor e os corpos poderiam colar gerando a sensação de que o momento seria eterno, talvez o fosse – gesticulou com as mãos e em voz audível – eterno o momento que os lábios se colam e que com a saliva deslizam de um lado ao outro, um na boca do outro, a dividir e se unirem, a sentir a respiração e a tragar o mesmo ar.
Antes de se entregar ao sono falou sozinho: - só cometi um erro, não fotografá-lo dormindo comigo, assim teria aquele momento para sempre na ilusão de uma fotografia.
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